A guerra comercial entre China e a Europa ganhou outro contorno nesta quinta-feira (4) — e o carros elétricos são os principais afetados na batalha.
A partir de amanhã (5), o União Europeia (UE) imporá tarifas de dois dígitos sobre as importações de veículos eletrificados (VEs) fabricados na China, de acordo com autoridades do bloco.
As taxas para a Comissão Europeia, o braço executivo da UE, variam entre 17,4% Isso é 37,6% — e são adicionais à atual tarifa padrão de 10% sobre as importações de automóveis.
A tributação foi criada para evitar uma “ameaça de inundação de veículos elétricos baratos produzidos com subsídios estatais”, segundo a presidente da UE, Ursula von der Leyen.
Vale ressaltar que os impostos anunciados pela Europa ainda são muito inferiores à tarifa de 100% que os Estados Unidos pretendem aplicar às importações de veículos elétricos chineses a partir de agosto.
A China retaliará?
No entanto, nem tudo está perdido para o dragão asiático – pelo menos por enquanto. Isso porque existe um período de quatro meses em que as tarifas são provisórias.
Isto significa que as negociações devem continuar entre as duas partes, enquanto a China ameaça retaliar, como a imposição de tarifas de 25% sobre os automóveis da UE com grandes motores a gasolina.
O chefe comercial da UE, Valdis Dombrovskis, disse que não há motivos para um possível contra-ataque da China.
“O nosso objectivo é…garantir uma concorrência leal e igualdade de condições”, afirmou, em entrevista ao Bloomberg.
O Ministério do Comércio da China disse que ambos os lados realizaram várias rodadas de negociações técnicas sobre tarifas sobre carros chineses.
“Esperamos que os lados europeu e chinês avancem na mesma direção, mostrem sinceridade e avancem com o processo de consulta o mais rápido possível”, disse o porta-voz do ministério, He Yadong.
Investigações da União Europeia
A quota de mercado das marcas chinesas na Europa passou de menos de 1% em 2019 para 8% atualmente — podendo chegar a 15% em 2025, segundo dados da Comissão Europeia.
Autoridades da UE alegam que o aumento nas importações de automóveis chineses foi impulsionado por “subsídios injustos” que permitiram que os veículos fabricados na China fossem vendidos a preços muito mais baixos do que os produzidos no bloco europeu.
Nas contas da Comissão, os preços dos automóveis asiáticos são normalmente 20% inferiores aos dos modelos fabricados pelos europeus.
A investigação anti-subsídios fiscais da União Europeia ainda tem cerca de quatro meses pela frente.
Após este período — que termina em 2 de novembro — se a Comissão concluir que é necessário evitar danos à indústria local, poderá definir a tributação dos VEs da China como um direito definitivo, que normalmente se aplica por cinco anos.
“Estas negociações com a China estão em curso e, de facto, se surgir uma solução mutuamente benéfica, poderemos também encontrar formas de não aplicar as tarifas no final do dia”, disse Dombrovskis.
“Mas está muito claro que esta solução teria de resolver a distorção do mercado que estamos a viver actualmente… e precisa de ser compatível com o mercado”, acrescentou.
O que está por vir?
No final da investigação antissubvenções, as empresas que sejam consideradas como cooperantes na investigação da UE estarão sujeitas a tarifas de 20,8%.
Enquanto isso, os fabricantes que, na visão do bloco, não ajudaram na investigação receberão uma alíquota de 37,6%.
A situação deixa algumas opções na mesa da China: os fabricantes chineses terão de decidir se absorvem as tarifas, aumentam os preços para cobrir os novos custos de milhares de milhões de dólares na Europa, ou mesmo impõem novos impostos em resposta à tributação europeia.
Um possível aumento nos custos dos veículos eléctricos chineses para os consumidores europeus poderia minar o objectivo da UE de ser neutra em carbono até 2050, uma vez que o bloco é o maior mercado externo para a indústria de veículos eléctricos da China.
Outra possibilidade é que os novos impostos possam encorajar os fabricantes chineses a investir em fábricas na Europa – mesmo que os custos de mão-de-obra e de produção sejam mais elevados do que em Pequim.
Nem mesmo os fabricantes de automóveis europeus o apoiam?
Mas o proteccionismo europeu não agradou a todos os fabricantes de automóveis da região, que temem que as novas tarifas possam desencadear retaliações por parte da China.
Afinal, o país asiático é responsável por um dos principais mercados automobilísticos do mundo. Os fabricantes alemães, por exemplo, cerca de um terço das suas vendas no ano passado foram feitas na China.
Portanto, possíveis contramedidas poderão afetar ainda mais a competitividade dos automóveis europeus em território chinês, onde os fabricantes já enfrentam a pressão do aumento dos concorrentes nacionais.
Maior fabricante de automóveis da Europa, a Volkswagen é uma das que se opõe à nova tributação dos carros elétricos chineses.
“Os efeitos negativos desta decisão superam quaisquer benefícios para a indústria automóvel europeia e especialmente alemã”, disse um porta-voz do fabricante num comunicado.
Em evento realizado no início do ano, o fundador da Capital Vista, João Landauafirmou que a Europa “brinca com fogo” – e é a verdadeira perdedora na disputa mercantilista global.
Para o gestor, os EUA podem adotar uma política tarifária de importação que funcione, pois é essencialmente um país importador —e teria condições de arcar com uma inflação mais alta para defender o protecionismo contra os fabricantes chineses, por exemplo.
Na Europa a situação é diferente. A região depende das exportações — ou seja, ganha dinheiro vendendo —, tem um custo de capital muito superior ao da China e ainda está atrasada na briga tecnológica.
“Se houver uma tarifa, a Volkswagen terá metade do seu lucro na China — e Pequim já avisou que, se houver uma tarifa na Europa, irá impor impostos também aos europeus”, disse o gestor.
“A Europa é uma economia de serviços, não tem de competir com o Vietname, a Malásia e a China produzindo industrialização. Por outras palavras, quanto mais indústria tivermos na base, pior será, como no caso da Alemanha.”
*Com informações da Reuters, CNBC e BBC.
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